Vistoria do imóvel: o que analisar antes de assinar o contrato

Vistoria do imóvel: o que checar antes do contrato

Por: Fernando M Martins

Leitura de 7 min

Bandeira dos EUA em frente a prédios

Vistoria do imóvel: o que analisar antes de assinar o contrato

Assinar um contrato de compra ou locação é um passo importante — e a vistoria do imóvel é a sua maior aliada para evitar surpresas. Um roteiro simples, mas atento, ajuda a identificar problemas estruturais, elétricos e hidráulicos, registrar evidências e entender prazos para apontar vícios de forma segura e documentada.

Resumo do que você vai ver:

  • Checklist prático de inspeção estrutural, elétrica e hidráulica.
  • Como fotografar, filmar e organizar as evidências da vistoria.
  • Prazos usuais para reclamar de vícios na locação e na compra.
  • Quando chamar um profissional (engenheiro/arquiteto) e o que pedir.

Por que fazer a vistoria do imóvel com calma

A vistoria reduz o risco de custos inesperados, obras emergenciais e conflitos pós-assinatura. Na locação, evita que o inquilino pague por danos preexistentes. Na compra, protege o seu investimento e embasa eventuais pedidos de reparo ou desconto. Além disso, uma vistoria bem documentada facilita qualquer diálogo com a administração do condomínio, imobiliária ou construtora.

Dica prática: leve trena, nível de bolha (ou um app de nível), carregador portátil, lâmpada teste, cabo de extensão, balde, pano, papel toalha, chave de fenda, uma moeda, uma bolinha de gude e o seu checklist impresso (ou no celular).

Inspeção estrutural: paredes, pisos, esquadrias e vedação

Mesmo sem ser técnico, é possível observar indícios relevantes de vícios aparentes que impactam conforto, segurança e custos futuros.

Paredes, tetos e pisos

  • Fissuras e trincas: pequenas fissuras de tinta são comuns; trincas largas (que caibam a ponta de uma caneta) ou com desnível podem indicar movimentação anormal. Fotografe com um objeto de referência (moeda ou régua).
  • Desnível e prumo: use a bolinha de gude para ver se ela “corre” sozinha. Encoste um nível de bolha em paredes e pisos; anote onde o desalinhamento aparece.
  • Oco no piso: bata de leve com a mão ou cabo de ferramenta. Som oco pode indicar peça mal colada — risco de desplacamento.
  • Rejuntes e rodapés: verifique se há falhas, trincas no rejunte ou afastamento do rodapé, que favorecem infiltração e mofo.

Umidade, mofo e infiltrações

  • Manchas e bolhas na pintura: sinal de umidade. Toque a superfície; se estiver fria e úmida, registre em foto e vídeo.
  • Cantos e rodapés: cantos de quartos e salas costumam concentrar mofo. Cheire ambientes fechados e armários.
  • Janelas e peitoris: simule chuva com borrifador e veja se há entrada de água por frestas.
  • Tetos de banheiros e sob lajes: procure por escurecimento e descascamento, indícios de vazamento do andar superior.

Portas, janelas e acústica

  • Esquadrias: abram e fechem sem esforço? Trilhos limpos, roldanas ok, borrachas de vedação íntegras? Teste trava e chave.
  • Portas: encostam e alinham no batente sem raspar? Olhe a luz que passa por baixo (pode indicar desnível do piso).
  • Ruído: com o ambiente silencioso, fique 2 minutos ouvindo ruído externo. Aponte fontes (trânsito, casa de máquinas, bares).

Inspeção elétrica: segurança, capacidade e funcionamento

A rede elétrica deve ser segura e dimensionada para o uso. Falhas aqui podem causar choques, curtos e prejuízo a eletrodomésticos.

Quadro de distribuição e disjuntores

  • Identificação de circuitos: verifique se os disjuntores estão rotulados (tomadas, iluminação, chuveiro, ar-condicionado). Se não estiver, peça que seja feito.
  • Dispositivo DR: procure o DR (diferencial-residual), que protege contra choque elétrico. Teste o botão “T” (de teste) e confirme se desarma.
  • Organização e aquecimento: cabos bem presos, sem emendas aparentes, sem cheiro de queimado. Ligue cargas (chuveiro/torneira elétrica) e observe se há aquecimento excessivo.

Tomadas, aterramento e iluminação

  • Tomadas: teste com um carregador. Em cozinhas e áreas de serviço, verifique se há tomadas suficientes e no padrão de 20 A para equipamentos mais potentes.
  • Aterramento: se possível, use um testador de tomada para checar fase, neutro e terra. Falta de aterramento aumenta o risco de choques.
  • Iluminação: leve uma lâmpada para testar pontos sem luminária. Observe cintilação ou variação de brilho (pode indicar mau contato).
  • Ar-condicionado: confirme dreno, disjuntor dedicado e circuito próprio próximos ao ponto de instalação.

Inspeção hidráulica e gás: pressão, vazão e drenagem

Problemas hidráulicos geram infiltrações e custos contínuos. Gás mal instalado é risco de segurança. Faça testes simples, porém completos.

Água fria e quente

  • Pressão e vazão: abra dois pontos ao mesmo tempo (chuveiro e torneira) e avalie se a água “some”. Observe estabilidade do aquecimento.
  • Registros: identifique registros setoriais (banheiro, cozinha) e o geral. Feche e abra para evitar travamento futuro.
  • Boiler/aquecedor: ligue o aquecedor a gás, verifique chama azul estável e ventilação adequada do ambiente.

Drenagem e esgoto

  • Ralos e sifões: despeje um balde de água e observe a drenagem. Gorgolejo, retorno de água ou mau cheiro indicam problema de ventilação/sifonagem.
  • Vaso sanitário: dê descarga e observe se a água sobe. Procure vazamentos na base (suja o rejunte).
  • Caixa de gordura: em casas e coberturas, localize e veja se há manutenção recente.

Gás e medidores

  • Engates e mangueiras: verifique validade e selo. Mangueira de gás vencida deve ser trocada. Cheque se há registro exclusivo para o fogão e para o aquecedor.
  • Vazamentos: faça o teste da espuma (água com sabão) nas conexões; se borbulhar, há vazamento. Jamais use chama para testar.
  • Medidores (água, luz e gás): anote as leituras na vistoria de entrada (locação) e guarde o registro com foto.

Documentos e itens legais que valem ouro

Além do estado físico, verifique documentos e conformidades que influenciam segurança e responsabilidades futuras.

Laudos, ART/RRT e autorizações

  • Habite-se: comprova que a obra foi aprovada pela prefeitura. Em imóveis novos, confirme a emissão e a data.
  • ART/RRT de reformas: mudanças estruturais, elétricas e hidráulicas devem ter responsabilidade técnica (engenheiro/arquiteto).
  • Manual do proprietário/condomínio: novo ou usado, é útil para saber prazos de garantia, limites de reforma e orientações de manutenção.
  • AVCB (quando aplicável): em edifícios, verifique se o condomínio está com Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros vigente.

Prazos para apontar vícios: o que a lei costuma prever

Os prazos variam conforme a natureza do negócio (locação ou compra) e o tipo de problema. Abaixo, um panorama geral de uso prático. Em caso de dúvida, busque orientação jurídica — este conteúdo é informativo e não substitui aconselhamento legal.

Na locação

  • Vistoria de entrada: deve acompanhar o contrato, descrevendo o estado do imóvel. O ideal é registrar tudo antes da entrega das chaves ou imediatamente após.
  • Prazo para complementos: muitos contratos preveem um período (geralmente de 7 a 10 dias) para o inquilino complementar a vistoria com fotos e observações. Confira o que está no seu contrato e comunique por escrito.
  • Conservação e reparos: vícios preexistentes devem ser comunicados à administradora/proprietário. Guarde protocolos de atendimento e registros.

Na compra de imóvel novo (relação de consumo)

  • Vícios aparentes e ocultos: o Código de Defesa do Consumidor costuma prever 90 dias para reclamar de vícios em bens duráveis, contados da entrega (no caso de vício oculto, o prazo conta a partir da evidência do problema).
  • Defeitos de segurança/danos: para reparação por danos causados por defeitos (p. ex., incêndio por falha elétrica), o prazo de prescrição é, em regra, de 5 anos a partir do conhecimento do dano e de seu autor.
  • Estrutural (solidez e segurança): o Código Civil estabelece 5 anos de responsabilidade do construtor por defeitos que comprometam solidez e segurança. Em geral, recomenda-se comunicar o problema à construtora e ao condomínio assim que identificado.

Na compra de imóvel usado

  • Transparência e diligência: a vistoria prévia é ainda mais importante. Vícios aparentes devem ser apontados antes da assinatura ou utilizados para negociar condições.
  • Vícios ocultos: se surgirem depois, é possível discutir responsabilização dependendo do caso (boa-fé, informação, natureza do vício). Os prazos podem variar conforme a hipótese legal aplicável.

Importante: guarde tudo por escrito (e-mail, mensagens com protocolo) e mantenha organização das evidências com datas. Isso costuma ser decisivo em eventuais tratativas ou ações.

Como registrar evidências da vistoria (sem complicar)

Registrar bem é tão importante quanto olhar bem. A lógica é simples: foto nítida + contexto + data + localização + observação.

Fotos e vídeos que “falam por si”

  • Comece pelo geral: filme um panorama de cada ambiente (porta de entrada, giro de 360°), depois vá aos detalhes.
  • Use referência de escala: coloque uma moeda ou régua junto à trinca/mancha para dimensionar o problema.
  • Geolocalização e data: ative localização e carimbo de data. Se usar apps de notas, inclua o endereço do imóvel.
  • Nomeie arquivos: use padrão “2025-01-10_sala_trinca_parede_leste.jpg”. Padronização facilita achar e compartilhar.

Checklist e organização

  • Planilha de ambientes: crie colunas para cômodo, item, status (ok/observação/pendência), evidência (link/foto), responsável e prazo.
  • Pasta na nuvem: mantenha tudo em um drive com subpastas por cômodo (sala, cozinha, suíte) e por sistema (elétrica, hidráulica, estrutura).
  • Protocole a entrega: envie o relatório por e-mail para as partes (imobiliária/condomínio/construtora) e peça confirmação de recebimento.

Roteiro de vistoria por cômodo (exemplo rápido)

Use este roteiro como base e adapte ao tipo de imóvel (casa, apartamento, novo, usado):

  1. Entrada e sala: porta, fechadura, interfone, piso e rodapé, tomadas e pontos de luz, janelas e vedação, ruído externo.
  2. Quartos: paredes e teto (mofo), esquadrias, tomadas próximas à cama, espaço para armários, antena/TV.
  3. Cozinha: pressão de água, pontos de gás/energia, ralo e caimento, azulejos, armários (fungos/odores), exaustão.
  4. Banheiros: chuveiro (água quente), bancada e sifões, box (vedação), ralo (escoamento), vaso (vedação/descarga), ventilação natural ou exaustor.
  5. Área de serviço: ponto de máquina, tanque, ralo, aquecedor (se houver), janela e ventilação.
  6. Vagas e áreas comuns: número e dimensões da vaga, acesso, iluminação, segurança e estado das áreas comuns (academia, salão, elevadores).

Quando chamar um profissional

Se você identificar trincas significativas, infiltrações persistentes, mau cheiro de gás, disjuntores desarmando sem carga, ou qualquer indício estrutural preocupante, considere contratar um engenheiro ou arquiteto para uma avaliação técnica. Em reformas, exija ART/RRT. Profissionais podem emitir laudos e indicar a melhor solução, estimando custos com mais precisão.

Erros comuns na vistoria (e como evitar)

  • Fazer tudo com pressa: reserve ao menos 60–90 minutos para um apartamento médio. Em casas, mais tempo.
  • Ignorar dias de chuva: se possível, visite o imóvel em dia de chuva para testar vedação de janelas e ralos externos.
  • Não testar simultaneamente: abra torneiras e chuveiro juntos; ligue iluminação e tomadas com carga para simular uso real.
  • Confiar só na memória: fotografe e anote. Detalhes somem depois de uma visita longa.
  • Assinar sem registrar: vícios não documentados viram discussão futura. Descreva no termo de vistoria e anexe fotos.

Antes de assinar o contrato: checklist final

  • Revise o termo de vistoria: confira se todas as observações e fotos foram anexadas.
  • Combine prazos e responsabilidades: defina quem corrige cada pendência e em quanto tempo — de preferência por escrito no contrato ou aditivo.
  • Tire dúvidas sobre garantias: em imóvel novo, confirme canais de assistência e prazos de atendimento da construtora.
  • Leia cláusulas de multa e devolução: em locação, entenda as regras de saída e a vistoria de desocupação.

CTA

Antes de fechar negócio, leve este roteiro na sua próxima visita e crie seu próprio checklist de vistoria. Uma hora bem investida hoje evita muita dor de cabeça amanhã.

Nota: As referências legais mencionadas são de caráter informativo e podem ter interpretações específicas conforme o caso. Em situações complexas, busque orientação jurídica especializada.